Ah! mas isso é psicológico…
Por que a psicoterapia pode ajudar quem sofre de Misofonia?
Este material foi publicado originalmente no Facebook – Grupo de apoio: Misofonia – Síndrome. Atualizamos com mais informações e imagens. Trata do caminho que percorri para obter a cura da Misofonia. Pode ser o primeiro passo para novas curas.
Levei pouco mais de três décadas para procurar ajuda Psicológica. Essa demora se deu principalmente por ouvir das pessoas ao meu redor:
Ah! mas isso é psicológico, é só da tua cabeça!
A maioria das pessoas eram leigas e usavam o termo Psicológico para me dizer que eu não tinha um problema real ou que não era algo orgânico ou neurológico e sim da minha cabeça, minhas manias, minhas idiossincrasias, mimimi, frescura, etc. etc. Pior que algumas não eram leigas, mas médicos e … alguns psicólogos.
E com isso eu – generalizei / desprezei / tive crenças limitantes / tratei superficialmente – você pode escolher qualquer um dos termos, mas todos estes estavam presentes em mim e com isso demorei a buscar ajuda psicoterápica.
E ainda tive contato com terapeutas querendo empurrar essa tal de Ressignificação como forma de amenizar ou mesmo curar esse problema da minha cabeça. Eu teria que ressignificar sentimentos, bla bla bla… a mesma ladainha sempre.
Para mudar isso tudo, precisei ter encontrado a Misofonia como provável causa do meu problema. Isso no final de 2016. Então pude me debruçar nos estudos científicos e começar a ver novos termos como, por exemplo, Homeostase e Neuroplasticidade.
A primeira é a Homeostase – mecanismo que promove os processos de equilíbrio corporal. A homeostase pode ser o principal problema quando se utiliza abafadores ou bloqueadores como solução principal para evitar os sons, pois ao reduzir a captação pela utilização destes acessórios, o sistema auditivo tenderá a compensar essa ausência de volume com mais sensibilidade, para equilibrar essa perda de volume da captação sonora. Isso ao longo do tempo inviabiliza o uso desses acessórios. Há aqui uma armadilha, pois a utilização por quem quer abafar sons de baixa intensidade do cotidiano pode alterar esse equilíbrio e causar Hiperacusia. Então frequentemente nos grupos, há postagens solicitando indicações de abafadores mais eficientes, pois os anteriores não estão mais funcionando devido a piora da sensibilidade, relatada nas postagens como piora da Misofonia. O outro extremo é a utilização de fones de ouvidos para sobrepor ao som que incomoda. A culpa não é fones, mas do volume. Geralmente quem tem apenas Misofonia costuma utilizar em alto volume. Reconhecidamente a utilização de fones, principalmente os intrautriculares causam danos auditivos com o tempo, inclusive Zumbido (tinnitus). Se for utilizar fones, é melhor que seja com cancelamento de ruído, pois assim não haverá necessidade de volume alto.
A homeostase parece também ser adversária das idéias utópicas como lugares silenciosos para convívio social ou lugares para se isolar da sociedade. Basta procurar relatos de pessoas que vão para países onde há silêncio durante a estação de inverno com neve e reclamam que ao retornar, parece que ficaram mais sensíveis. Ideias distópicas que envolvam qualquer ditadura do silêncio também não terão “boa aceitação da homeostase”. Aqui preciso alertar para não confundirmos as coisas. Estou citando processos internos do organismo de cada pessoa e não direitos como cidadão, como ter acesso a ambientes e/ou momentos de silêncio e tranquilidade, principalmente no ambiente doméstico.
Prestem atenção nos relatos na internet, principalmente em grupos de rede social. Muitas pessoas relatando que pioraram com o tempo. E adivinhem? ou precisam trocar de abafadores ou bloqueadores, pois estão lutando contra a homeostase ou estão causando traumas auditivos com a utilização de fones de ouvido num volume intenso.
A segunda é a Neuroplasticidade – capacidade do sistema nervoso de mudar estruturas e funções quando submetido a novas experiências. Então pude entender que há caminhos para alterar meu cérebro ao me submeter a novas experiências, aprendizados e atitudes da mesma forma que posso alterar minha forma física através de exercícios físicos.
Mas ainda sim, eu resistia a tal da Ressignificação, principalmente a que era “vendida” junto com algumas psicoterapias.
Então foi preciso mais alguns meses para entender essa dinâmica e depois que fui estudar artigos sobre as Bases Neurobiológicas do comportamento finalmente me convenci que poderia mudar meu cérebro para não me fazer sofrer com sons de intensidade insignificante através de mudanças de hábitos e atitudes. Se essa mudança fosse potencializada por um processo psicoterápico, traria melhores resultados.
Um adendo – sons de boca, ou de respiração – por exemplo, não tem potencial de causar trauma auditivo, portanto são sons em intensidade insignificantes com relação a sua na captação pelos ouvidos. Em outras palavras, não são barulhos! Eu frequentemente faço esse alerta, pois muitos com hiperacusia (e a maioria não sabe) usam o termo barulho sons altos e outros com Misofonia usam o mesmo term, barulho, para sons baixo e isso costuma a confundir a todos que tendem a pensar que todo problema com som é Misofonia.
Então finalmente aceitei que aquela Ressignificação – que eu odiava tanto quando me prescreviam Psicoterapia – era exatamente o que ia promover, em mim, essa neuroplasticidade que tanto precisava, desde que orientada para exatamente combater aquela resposta sofrida a sons.
Claro que poderia não bastar só isso, pois ainda não há tratamentos definitivos para Misofonia com número suficiente estudos científicos que os validem, até porque, de um lado, a misofonia ainda nem foi definida como um novo tipo de transtorno ou como sintoma de outros transtornos já estudados e conhecidos por Neurologistas/Psiquiatras e por outro lado, sua proximidade com o modelo neurológico do Zumbido (tinnitus) e a frequente associação com Hiperacusia, mostram que Otorrinolaringologistas e Fonoaudiólogos(as) tem importante participação no diagnóstico e tratamento.
Só que:
Não importa o que causou a Misofonia dentro de cada um: seja por causa genética ou ambiental; seja Neurológico ou por traumas. Depois que o sofrimento, a irritação e outros sentimentos negativos te torcem por dentro, será necessário alguma forma de psicoterapia.E então é aqui que entra a ajuda Psicológica!!!!
Alguns acreditam que só com uso de medicamentos como antidepressivos ou ansiolíticos ou anti-sei-lá-mais-o-quê terão a solução ou melhora. Podem sim. Dependendo do caso, principalmente se identificado algum transtorno psiquiátrico associado. Porém, no caso da prescrição de antidepressivos:
Então voltamos para a psicoterapia como estratégia para nos ajudar a vencer a Misofonia, ou pelo menos, nos ajudar a ter uma melhor qualidade de vida, vivendo um dia de cada vez. O argumento que isso é psicológico ou da minha cabeça agora tem outro significado. Talvez não para quem tenha dito, mas para mim é um caminho.
E é claro, dependendo de cada caso, só Psicoterapia pode não resolver, por isso que precisa de uma abordagem que envolva especialidades da área da saúde como Otorrinolaringologia, Psiquiatria e Fonoaudiologia. Então seria uma abordagem Biopsicossocial. Comentarei isso em outra postagem neste blog.
Qual psicoterapia?
A partir de 2019, três relatos de cura foram publicados no grupo de apoio Misofonia – Síndrome. Nos três relatos a psicoterapia foi um dos tratamentos ou foi o principal tratamento. São elas: TCC – Terapia Cognitivo Comportamental, EMDR, HQI – Homeostase Quântica Informacional e Psicoterapia Contemplativa. Só a TCC tem estudos publicados, até agora, de sua utilização no tratamento da Misofonia. A EMDR é referenciada em alguns sites de misofonia e não encontrei nenhuma referência de HQI e Psicoterapia Contemplativa, no caso, só relatos de quem se curou ou de quem está melhorando com o tratamento. Estou aguardando relatos dessas últimas aqui no blog. Há o meu relato onde cito a TCC e EMDR em [Quais tratamentos realizei?].
O fato de não citar outras abordagens psicoterápicas foi porque não encontrei nenhuma referência de tratamento específico para Misofonia com essas abordagens e não as invalida, em absoluto. Nos grupos de apoio encontramos tanto relatos de melhora quanto de não haver melhora utilizando psicoterapia, inclusive com algumas das citadas no parágrafo anterior.
E para finalizar, há ainda um outro problema para muitos:
Eu não tenho plano de saúde ou como pagar consultas com profissionais Psicólogos(as). O que fazer?
Eis alguns caminhos:
Universidades Federais – a maioria das universidades federais oferecem serviços de atendimento psicológico gratuito:
https://revistagalileu.globo.com/Ciencia/Saude/noticia/2018/10/saiba-onde-encontrar-servicos-gratuitos-que-oferecem-terapia.html
Faculdades de Psicologia (particulares) – algumas oferecem esse serviço gratuito:
https://psicologiaacessivel.net/2015/09/17/atendimento-psicologico-gratuito-onde-buscar/
CRAS – Centro de Referência de Assistência Social – neste caso, se identificado que você se enquadra como em vulnerabilidade social, você poderá ser encaminhado para profissionais dentro da rede SUS. Uma questão é verificar se as pessoas que moram com você e que negligenciem a possibilidade de você estar com Misofonia ou qualquer outro problema que te traga sofrimentos emocionais ou que não te respeitem ou ainda te impeçam de ter acesso a tratamentos. Caso esta situação ocorra, verificar se pode ser considerado como estando em vulnerabilidade social. Saiba mais:
http://mds.gov.br/assuntos/assistencia-social/unidades-de-atendimento/cras
CAPS – O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece atendimento psicológico de forma gratuita nos chamados CAPS (Centro de Atenção Psicossocial). Saiba mais:
https://saude.gov.br/saude-de-a-z/saude-mental
Pesquisando com as palavras [psicologia gratuito] ou [atendimento psicológico gratuito] nos buscadores (sem os colchetes), você encontrará mais resultados.
*A imagem principal desta publicação foi baixada gratuitamente do site pixibay.com e alterada.
Sou psicóloga, gostaria de receber informações de como tratar um paciente com Misiofônia.
Fico feliz em saber de sua melhora , caro colega, eu sofro com isso há décadas e descobri essa síndrome através de uma reportagem do Fantástico. Atualmente estou bem, medicada, mas já fui muito infeliz por causa dessa condição. Será mesmo possível ser um ex- misofonico?
Olá Fabiana. A sua dúvida é a de muitos.
Se você considera, como eu, Misofonia como reação neuro/emocional/comportamental em resposta a uma baixa tolerância a sons específicos, minha reposta é SIM. E é o meu caso.
Muitos confundem Misofonia com Hiperacusia que é uma baixa tolerância ao volume (intensidade) dos sons. Podem reverter os sintomas de Misofonia mas ainda ter os sintomas de Hiperacusia e achar que não estão curados. Não foi o meu caso.
Além disso, misofonia compartilha sintomas com dezenas de problemas médicos, psicológicos, auditivos e psiquiátricos, o que confunde o entendimento do que seja ou que não seja Misofonia. Considere que mesmo com os 78 estudos publicados, por exemplo na Biblioteca Virtual de Saúde, ainda não se chegou a um consenso se Misofonia é um Transtorno Psiquiátrico, sintoma de outros Transtornos Psiquiátricos, se é um Transtorno Auditivo ou Psicológico.
E para complicar ainda mais. Muitos apresentam sintomas característicos de Misofonia mas também sintomas de outros problemas, ou como os médicos dizem, comorbidades. por exemplo, TDAH, TDA, TOC, Síndrome de Tourette.
Então ainda precisamos aguardar o avanço das pesquisas. Por enquanto temos três relatantes de cura, no grupo de apoio [Misofonia – síndrome] no facebook . Todos relatam 100%.
Então, a minha resposta, considerando o meu caso é SIM – é possível estar 100% ex-misofônico(a)
Recomendo a leitura da publicação abaixo, elaborada pelos principais pesquisadores sobre Misofonia da atualidade. O conceito que citei no início deste texto, retirei de lá:
https://misofonia.org/avbm/artigo-cientifico-publicado-pelas-maiores-autoridades-em-misofonia/
Olá Alexandre. Gostaria de saber mais sobre técnicas utilizando a TCC como forma de minimizar a mis9foniae hiperacusia.
Olá Márcia,
Publiquei sobre TCC no site da Associação virtual Brasileira de Misofonia. Eis o link:
https://misofonia.org/avbm/tcc-minha-cura/
Não deixe de ver vários vídeos sobre Misofonia, inclusive sobre TCC na TVMisofonia: https://www.youtube.com/tvmisofonia